Ballet de Cegos será atração durante as Paralimpíadas
Na Casa Brasil Paralímpico, em Saint-Ouen-sur-Seine, um dos destaques será a Companhia Ballet de Cegos da Associação Fernanda Bianchini. Pioneira e única no mundo, a companhia transporta ao público uma série de apresentações que exemplificam a inclusão por meio da arte. Com apresentações programadas para os dias 30 e 31 de agosto, e 1, 2, 4, 5 e 7 de setembro, a companhia apresentará coreografias como “O Velho e a Flor”, “Samba” e “Tributo às Olimpíadas”. “Paris será mais um sonho realizado por esta companhia que aprendeu desde muito cedo a nunca desistir”, disse Fernanda Bianchini, fundadora da Associação. Segundo ela, as apresentações, que vão do balé clássico ao samba, são qualificadas com dedicação e amor, destacando o protagonismo dos bailarinos cegos.
Fundada em 1995, a Associação Fernanda Bianchini é reconhecida por sua contribuição significativa à inclusão social por meio da dança. A organização desafia preconceitos e promove a valorização das capacidades artísticas de pessoas com deficiência visual. “Hoje, nos nossos espetáculos, o que eu mais escute é: ‘Elas não enxergam? Onde está a deficiência?’. Quando a deficiência não é vista no palco e sim a bela arte, é a certeza de que alcançamos nossos objetivos. A A presença da companhia nas Paralimpíadas reflete essa trajetória de luta e conquista”, comentou Fernanda.
A Casa Brasil Paralímpico funcionará das 15h às 22h, oferecendo uma programação diversificada que inclui atrações, diversas apresentações e performances da Companhia Ballet de Cegos. “A participação da companhia nas Paralimpíadas é um marco para nós. Mostrar que a deficiência visual não é um impedimento para a arte e para a realização de sonhos é um dos nossos principais objetivos”, afirmou Bianchini, destacando que cada apresentação é uma mensagem de superação e inclusão.
Breaking dá Adeus aos Jogos Olímpicos após Apenas uma Edição:
O que levou à decisão e como isso impacta o esporte no Brasil?
O Breaking, que fez sua estreia olímpica nos Jogos de Paris 2024, já está se despedindo do maior palco esportivo do mundo. O Comitê Olímpico Internacional (COI) anunciou recentemente que a modalidade não será incluída nos Jogos Olímpicos de Los Angeles em 2028, uma decisão que surpreendeu tanto os atletas quanto os fãs do esporte.
A Ascensão e Queda do Breaking Olímpico
A inclusão do Breaking nas Olimpíadas de Paris foi um marco histórico. O esporte, que surgiu nas ruas do Bronx, em Nova York, nos anos 1970, evoluiu de um movimento cultural para uma competição de alto nível. Durante os Jogos de 2024, o Breaking não só trouxe um novo público para as Olimpíadas, mas também destacou atletas como a americana Rachel Gunn, conhecida como Raygun, cuja performance eletrizante conquistou corações e mentes.
No entanto, mesmo com a aclamação e popularidade entre os jovens, o COI decidiu não manter o Breaking no programa olímpico de 2028. Segundo fontes próximas ao comitê, a decisão foi influenciada por uma série de fatores, incluindo a pressão para incluir outros esportes emergentes e a necessidade de equilibrar o número de modalidades. Apesar das origens do Breaking nos Estados Unidos, a modalidade não garantiu o espaço necessário no competitivo cenário olímpico.
A Repercussão e o Futuro do Breaking
A exclusão do Breaking causou descontentamento na comunidade global de dançarinos e fãs do esporte. No Brasil, onde o Breaking tem ganhado cada vez mais popularidade, a notícia foi recebida com decepção. Os atletas brasileiros, que estavam se preparando para competir em Los Angeles, agora enfrentam um futuro incerto.
A Importância da Deliberação Brasileira
Em meio ao cenário internacional, uma revelação impactante veio à tona no Brasil. Recentemente, um grupo de atletas e dirigentes brasileiros afirmou, em uma delação coletiva, que a exclusão do Breaking foi influenciada por pressões comerciais e políticas dentro do COI. Segundo essas fontes, havia uma forte pressão para que esportes mais tradicionais e com maior apelo midiático fossem priorizados, mesmo que isso significasse sacrificar modalidades emergentes como o Breaking.
Essa delação trouxe à tona discussões sobre a transparência e os critérios utilizados pelo COI para determinar as modalidades olímpicas. Muitos críticos agora questionam se o processo de seleção de esportes está sendo guiado por interesses financeiros em vez de considerações esportivas.
O Legado e a Luta pelo Reconhecimento
Apesar do revés, a comunidade do Breaking está determinada a continuar promovendo o esporte e lutar por seu lugar nos futuros Jogos. Em várias partes do mundo, incluindo o Brasil, já há movimentos para pressionar o COI a reconsiderar a decisão ou, ao menos, garantir que o Breaking possa retornar nas Olimpíadas de 2032.
A exclusão do Breaking dos Jogos de 2028 é um lembrete de que, no mundo das Olimpíadas, nem sempre o sucesso e a popularidade imediata são suficientes para garantir a continuidade de uma modalidade. O futuro do Breaking como esporte de elite ainda está em jogo, mas a paixão e a dedicação de seus praticantes certamente continuarão a impulsionar o movimento.
Conclusão
A decisão do COI de excluir o Breaking das Olimpíadas de Los Angeles em 2028 foi recebida com surpresa e frustração, especialmente no Brasil, onde o esporte tem crescido em popularidade. As alegações de pressões políticas e comerciais que influenciaram essa decisão lançam uma sombra sobre o processo de seleção olímpica, e o futuro do Breaking agora pode depender do apoio contínuo de sua comunidade global.
Ballet de l’Ópera National de Paris
Don Quixote – Segundo Miguel de Cervantes
Cor. e mise-en-scène Rudolf Nureiev segundo Marius Petipa
Mús. Ludwig Minkus, arranjo musical John Lenohbey
Por Celi Barbier
Esplendor da coreografia e do Ballet de l’Ópera de Paris- Antes de começarmos a falar do radioso espetáculo, um pensamento sobre a fabulosa obra literária, que atravessa os séculos desde 1605/1615. Do autor quase não se fala. Seria importante? – alguém perguntou. “Tudo vale a pena se a alma não é pequena”; Resposta óbvia do nosso querido Pessoinha, Fernando Pessoa para os menos avisados. Importante instruir, a mente amando. Don Quixote, a segunda obra mais editada depois da Bíblia, traduzida em 60 idiomas e, a partir do século XVIII temática, para digressões literárias e artísticas, e também filosóficas.
Os nossos leitores não se arrepiem. Não contaremos sua biografia, tão extensa e interessante como sua obra, cuja segunda parte conta 59 capítulos, engenhosamente narrativa escriva durante dez anos, a primeira parte publicada em 1605. Miguel de Cervantes Saavedra nasceu em Alcalá de Henares, Espanha, em 1547, e falecerá um ano depois da publicação da segunda parte de seu Don Quixote em 1616, sem saborear, finalmente, o sucesso bem merecido. Foi o quarto filho de uma família de sete crianças, família modesta, o pai barbeiro-cirurgião, já na época. Cortar o cabelo, afinar a barba segundo os traços do rosto, desenhar finamente o bigode, mas também ajudando quanto às necessidades médicas e as sangrias.
A família viajava de cidade a cidade à procura de uma vida mais segura e melhor remunerada. Imaginamos que essas andanças influenciaram a personalidade do jovem Cervantes e suas futuras andanças – imaginárias e reais -, germinando quem sabe, já, seu Quixote. Ávido de leitura, devorava livros e livros, pois a curiosidade é filha da inteligência. Mesmo sem estudos universitários, passou por uma escola jesuíta , ao que parece, como consta em sua própria novela ‘Histórias Exemplares – aliás uma miniatura literária das melhores (1613). Muito interessante saber que continuaria os estudos numa renomada escola “erasmista”, segundo os conceitos religiosos e filosóficos de Erasmus, encarnando o espírito do humanismo contra “todos os fanatismos” (1463-1536).
Seu mestre Juan López de Hoyos, da Escola Municipal de Madri, refere-se a ele como “um adorável aluno”. Suas idéias filosóficas sobre a religião nos parece precursora do Século das Luzes (XVIII), o pensamento de Voltaire que prega esmagar as superstições e nunca a fé. O ano de 1569 foi determinante. Seu poema fúnebre sobre a jovem Rainha Elisabeth de Valois, no reinado de Philipe II, mereceu a confiança do soberano.
1563 – uma página importante inscreve-se no seu destino. Partindo para a Itália, mais para fugir da Espanha depois de um tumultuado período de duelos, desesperanças, mais andanças. Alista-se na Armada espanhola. Durante a batalha de Lepanto, perde o braço esquerdo. Segundo a Enciclopédia Bordas, a mão esquerda e um terço do braço, daí o apelido de O Manco de Lepanto. Voltando à Espanha, foi capturado por piratas (1575) e feito prisioneiro dos argelinos durante cinco anos, na prisão começará a segunda parte de seu Don Quixote. Resgatado por 500 escudos de ouro em 1580, chega de volta à pátria.
Vamos dizer que Cervantes, aliás Alonso Fernández de Avellaneda, pseudônimo que preferiu usar para “assinar” a última parte de seu Don Quixote, os 59 capítulos sob o título de “Segundo tomo do engenhoso fidalgo Don Quixote de la Mancha”. Para provar a identidade da obra, o confessor de Philipe II e Lope de Vega e Cervantes ele mesmo. “Sim, Don Quixote nasceu por mim mesmo e eu para ele: ele agiu e eu escrevi. Nós fomos feitos um para o outro”.
Ainda falaremos de Cervantes, seu Don Quixote e sua influência em vários setores das artes, até nossos dias, passando pela Dança, Marius Petipa, Rudolf Nureiev e o Ballet da Opera de Paris. Pouco importa à obra, vasta. Peças de teatro, poemas, poesias satíricas, comédias, múltiplas novelas contam o pitoresco das cidades espanholas, com humor e vivacidade. Experimentou com sucesso, às vezes pouco, todos os gêneros literários, salvo o romance épico. “Na delicada articulação entre a Idade Média e os tempos modernos, com uma imaginação transbordante, soube unir o fantástico à realidade e pintar seus personagens da cor da universalidade”.
Viajaremos com eles na próxima edição.
Nationaltheater Manheim
Ballet do Nationaltheater
Criação mundial: “Schwerelos”
(‘Liberto da Gravidade’)
Cor. Stephan Thoss; costume, cenários, luzes R. Liebig, N. Berry
Mús. A. Gosfield, K.M. Karlsen, J. S. Bach
Liberto da Gravidade
Parte II
Por Celi Barbier
Gostaríamos de citar algumas frases do programa, para maior compreensão dos leitores, no ensaio ‘Schwerelos’: leveza (gás) e peso (pedra). Isso deu origem a ideias sobre subir (com facilidade) ou voar e cair. Na Física, massa e peso são iguais. A massa de um objeto é igual em todos os lugares; o peso depende da localização. Um objeto na Lua é seis vezes mais leve que na Terra.
Continuamos com a gravidade terrestre junto ao “Cosmos”, que nos parecem obras complementares, cujos temas são interessantes e originais. Apesar de Thoss guardar as linhas, por assim dizer, de pés no chão. “O que me parece importante na atual situação é que tenhamos mais consciência das coisas. Por exemplo, olhamos para o céu, talvez seja noite e desejamos partir, mas não sabemos como é bonito aqui em baixo. Olhamos para o céu e finalmente gostaríamos de estar lá, onde não há consistência mas só obscuridade e, o mais importante, não existe gravidade. Aqui para nós, é importante a força da gravidade, de atração das massas, umas contra outras. É maravilhosa essa pesquisa sobre a gravitação, o sistema solar, os planetas. Interessante o pensamento sobre uma grande família onde a massa é maior, e uma pequena família, uma massa menor. Olhamos para o céu com nossos pés firmes na nossa maravilhosa Terra, na festa das flores, das árvores da floresta que se entrelaçam e que são quase um símbolo da nossa Terra, em relação ao cosmos, na sua complementaridade”.
Ruídos, seres armados, ao solo, e suas vítimas. Obscuridade, atmosfera densa. Como a obra é abstrata, nenhuma possibilidade de contá-la, senão seguir a música-coreografia e a emoção sentida, a participação – junto às luzes, à obscuridade e aos silêncios. As composições de A. Gosfield estão entre música e ruídos. Mulheres em saias longas correm (1º. Solo, Karlsen-Cello), umas atrás das outras, em jogo de saias, vivendo o movimento dos corpos. Depois, o silêncio, apenas tolerável. Três homens, uma mulher, duas mulheres, uma delas sentada de costas ao público. Os seis se procuram e se encontram no fundo de uma memória desesperada. Respiração. Os “soldados” voltam com suas saias negras em plissé, um estranho belo momento. Plasticidade, Um solo do soldado mais além do desespero e do sofrimento. As mulheres e eles. Simbologia das mãos fechadas sobre o rosto, chorando, e das mãos abertas em torno do rosto. Agora são mãos abertas de perguntas, mãos cruzadas com “ele”, de força. O homem de poder, as mãos apontadas para o solo, com violência. Cada um no seu universo e seu destino. Depois, um jogo de luzes psicodélico, em que tudo vai mais rápido e mais rápido ainda, como um “big bang”. A luz então fica clara, deixa ver um “soldado” no meio dos corpos. Lindo momento, piano e duo, magnífica a bailarina... Todos em círculo à volta dos soldados, estes transformados em flores.
Como acentuamos na Parte I, a música é para Thoss o fator primordial de suas obras. Esta, como sempre das mais originais, surpreende pela escolha e tratamento da trilha sonora. A. Gosfield, compositora americana nascida em Filadélfia (aqui, sua obra é Manufacture of Tangled Ivory), fez seu nome com composições “não musicais”. Um estágio em Nürenberg para pesquisa de possibilidades acústicas, de ruídos, lhe fez “tão bem” que resolveu passar à música de câmera, criando também seu próprio grupo de ópera e orquestra. Em 2017, sua primeira ópera serviu de fundo musical para o filme de Orson Welles ‘ A Guerra dos Mundos’.
K. M. Karlsen é um dos mais marcantes compositores noruegueses. Primeiramente organista para igrejas, seu Quarteto no. 3
op 121 fascina pela importância dada ao Cello. Intensidade, nuanças e dissonâncias dos Fortefortissimos acordes (David Rolf, Sociedade dos Compositores Noruegueses, 2000). Quanto ao Concerto em Ré menor BWV 974: II Adagio, de J.S. Bach, que dizer de uma de suas obras primas?
‘Liberto da Gravidade’ é um detonador de emoção. Como um mago, Thoss nos leva ao que tantos famosos coreógrafos tentam atingir. Pensamos, a princípio, ser uma obra metafísica, o que vem depois ou além de (meta) da física. Quer dizer, tudo o que não é dado pela experiência sensível, mesmo necessária à inteligência da realidade. Kant tampouco nos contentou com sua definição (Deus, Alma e o Mundo), ou Heidegger, que parte da realidade humana do ser ou compreensão do ser. Fomos ainda procurar pelo lado da Esperança. Que tem a ver, no Cristianismo, com crença e o amor. Já Kierkegaard analisa a consciência humana pelo desespero; este é universal, embora incompreensível ou incompreendido. Para os existencialistas, seria o contrário do medo, seja o ser e o futuro.
Enfim, pensamos que Schwerelos tem a força da não-mensagem, que a obra é suficiente a ela mesma, mais próxima da astrofísica que da nossa pobre história da Esperança. Já diz, então, Stephan Thoss, para nos tranqüilizar: “Alguém, realmente, quer ir para o espaço por mais tempo? Estariam as pessoas não bem aconselhadas para pensarem em salvar o planeta azul? Você pode sonhar menor? Não seria aconselhável que as pessoas se envolvessem na salvação do planeta azul? Dois componentes foram associações formativas nos trabalhos dos ensaios de Schwerelos: leveza (gás) e peso (pedra). Isto deu origem a ideias de subir (com leveza) ou de voar e cair”.
Mas, e a Dança nisto tudo, minha Sra.? Magnífica. Onze bailarinos thossianos de alto nível, porque o coreógrafo exige muitíssimo, que seja artística, mental, técnica e musicalmente. Colados à música e concentradíssimos, esquecendo as dificuldades do pequeno espaço e das parcas possibilidades das luzes, fizeram de seus corpos exemplares a magia desta obra profundamente emocional. Devemos citá-los todos: E.K. Tilson, L. Cheng, J. Bergmans, S. Cassata, A.D. Francesco, A. Galindo, J. Headley, A.C. Samion, L.T. Torres, R. Tan, L. Terzo.
Uma bela novidade: a obra, junto a Kosmos (parte III), foi convidada pelo prestigioso Balé de Sttutgart para apresentar-se, proximamente.
Nos dias:
28-05-2024
07-06-2024
05-07-2024
12-07-2024
Parabéns.
Kosmos
National Ballet Manheim
Balé do Nationaltheater
‘Kosmos’
Cor. e cenário Andonis Foniadakis
Música-vídeo Julian Torride
Costumes Anastasious Sofronious
Por Celi Barbier
“Kosmos” (Cosmos)
O coreógrafo A. Foniadakis ostenta um palmarès extraordinário. Nascido na Grécia, na belíssima ilha de Creta, ali surpreendentemente começou seus estudos de dança clássica. Diplomado pela Escola de Dança do Estado de Atenas, ganha a Bolsa de Estudos Maria Callas e, logo depois, parte para aperfeiçoamento em Rudra Béjart Lausanne, na Suíça. Dois anos. Estamos agora em 1994, quando entra para o Béjart Ballet Lausanne, seguindo-se o Lyon Opera Ballet e a consagração como bailarino, dançando obras de S. Teshigawara e também de prestigiosos coreógrafos, como M. Marin, J. Kylian, W. Forsythe, N. Duato, M. Ek, M. Béjart, O. Naharin, entre outros. A lista é grande, e maior ainda a de suas obras encenadas, doravante. Citaremos só algumas: Companhia Nacional de Dança de Espanha, Martha Graham Dance Company, Genève Ballet, Lyon Opera Ballet, Rambert Dance Company e, no Brasil, o Balé da Cidade de São Paulo e o Washington Ballet. E por aí vai. De Stuttgart a Sydney, com pleno sucesso. Sem falar nos prêmios. Por ‘Las Noces’ (I. Stravinski), para a Ópera de Firenzi, foi honrado com o MaggioDanza 2018. Por ‘Galaxy’, o prêmio da crítica especializada e a Associação de música e dança da Grécia. Em 2016, foi nomeado diretor de balé do Nacional Ballet da Grécia, mas já desde 2003 tinha sua própria companhia em Lyon, Apotosoma - Andonis Foniadakis, onde continua a apresentar suas obras.
“Cosmos”
Um bailarino entra em cena, sapateado e ritmo nas mãos, costume negro. Ao longe, imagens de erosão, destruição; ainda a gesticulação de mãos. Surge uma moça, longos cabelos louros, em contraste com os dele, negros e encaracolados. Particularmente belo. Música em tons orientais, obsedante. Ele continua com o ritmo nas mãos. Começam do começo. Tocam a pele um do outro. Voz de mulher, como uma estranha prece. A música forte hipnotiza. Duo masculino e feminino iguais. Dança lembrando a dos dervixes. Embriagante. Magia dos cabelos soltos, sob a luz dourada, azul e negra, iluminando-se e apagando-se. A composição aqui parece dar mais e mais dramaturgia à coreografia. Sucede-se um impressionante duo, entre os grand-sauts, movimentos ao limite das dificuldades físicas, de rapidez, de técnica.
Apesar da loucura dos movimentos e saltos, piruetas e trabalho ao solo, as linhas cênicas são respeitadas, bem como suas formas no espaço. Tal como uma das definições da obra, há uma fuga ao Cosmos, que faz parte do Infinito. Longe da gravidade terrestre, um beijo a dois. A música sinfônica, nesse momento, exige que a preencham pelos gestos, fluidez e mesmo rapidez, saindo do selvagem. Um belo pas de deux, com portés clássicos, não foi suficiente para justamente preencher a composição musical. Fazer-se arrastar. Um rapaz, depois as moças arrastam os homens. As “tablas” iniciam um novo momento (falta, a meu ver, um melhor trabalho de torso), que parece um pouco longo, mesmo se há um êxtase no final, quando entra um bailarino, collant cor da pele, sob a luz branco-dourada. Todos os bailarinos caminham para trás, em linhas puras. É belíssimo... Sob instrumentos de corda, uma mensagem contínua com portés, e um círculo se forma. Homens e mulheres encontram-se, abraçam-se e se beijam... e se deixam.
Obras complementares, certamente, “Schwerelos” de S. Thoss e “Kosmos” de A. Foniadakis. Respeitando a “ordem do universo”, definição de “Cosmos”, do grego antigo “Kosmos”, faz parte do universo, este Infinito compreendendo a Terra e o sistema solar. Enfim, parece que não há um “depois no espaço” e que o espaço não tem limites. Mais bonito ainda, o “Universo e suas leis, ou de modo mais geral, todo o Universo real ou surgindo de uma concepção científica ou fantástica”.
“Kosmos” Mús. Julien Tarride
Não poderíamos deixar de falar do compositor desta esplêndida obra. Percurso atípico e fabuloso. Além de compositor, artista de artes plásticas, começa seus estudos de música clássica, interessa-se pelo jazz e pela música contemporânea e eletrônica. Como Foniadakis, passa pelo Conservatório de Música de Lyon (1997-2002). Ao mesmo tempo, frequenta a Academia Nacional de Artes Plásticas de Lyon e ainda (ufa!) estudos no Estúdio Nacional de Artes Contemporâneas de Lyon do Fresnay, no setor cinema e novas tecnologias. Assim pode trabalhar, nem mais nem menos, com J-Luc Godard, C. Akerman, D. Link, entre outros.
A partir de 2002, Tarride trabalhará como compositor e coreógrafo para A. Foniadakis, B. Millepied, D. Brun, K. Ossola. Compositor para grandes obras coreográficas de prestigiosas companhias, como a Martha Graham Dance Company e a National Dance Company of Wales, trabalha também com outros , artistas plásticos, escritores e meteurs-en-scène de filmes. Continua em expansão, como também o espaço. Combina as artes de teatro com as artes de representação, as novas tecnologias geradas por computador, partituras, vídeos e imagens de computador em 3D. Sua composição “Kosmos”, criada primeiramente em 26 de outubro 2014 para o Les Ballets Jazz de Montréal foi, certamente, retrabalhada para a Casa de Dança do Nationaltheater Manheim. Uma obra forte, densa, que seja pela rapidez dos “tempi”, pela parte oriental e das tablas, que obtêm uma extensão até uma parte sinfônica, inesperada, abrindo-se à respiração, ao ar. Se colada à coreografia, a composição permite-se de vez em quando um contraponto faz bem a esta. O todo é de grande qualidade.
“Os estilos”
Não conhecíamos Foniadakis, o que é uma pena. Mas agora... Esplêndida, inteligente, musical, a coreografia nem lembra Béjart, nem Graham ou Oharin. A assinatura nos parece autêntica, no virtuosismo do vocabulário coreográfico, na intensidade do movimento e tratamento do espaço. Como explicamos, a grande musicalidade. Contamos entre os 11 bailarinos 6 que, se não me engano, também dançaram “Schwerelos”: L. Cheng, A. Di Francesco, A. Galindo, R. Tan, L.T. Torres, E.K. Tilson. Certo, houve uma pausa, mas para os pulmões... Bravo! Mas não é para que os invejem, estão os outros igualmente maravilhosos!
Stephan Thoss, decênios passados. Não tem estilo. Igual a ele mesmo. Fazendo quase parte das partituras das composições que usa, ele varia, desenvolve, cria junto à própria dramaturgia e concepção da obra ora realizada. É sempre surpreendente, nunca decepcionante. Seus bailarinos, formidáveis, combinando o ecletismo dos vários estilos coreográficos a uma sincera “joie de danser”, continuam a nos encantar.
“Entre a força forte, a força fraca, a força eletromagnética e a força da gravidade de intensidades diferentes, a gravidade é a mais fraca destas forças, mas de um infinito impacto”.
Stephan Thoss escolheu bem!
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Bayerisches Staatsballett
(première mundial)
Cor. Alexei Ratmansky
Mús. Piotr Ilich Tchaikovski (Ouvertures)
Por Celi Barbier
O que era um título de trabalho ficou sendo o verdadeiro título, o que achamos consequente, já que outro implicaria ser o de uma obra em si. Aqui não se trata de uma obra com dramaturgia interna. Entre a Elegia, (música de cena sobre Hamlet), Fantasia-Hamlet, A Tempestade, Fantasia para Orquestra, Romeu e Julieta (dueto cantante para soprano e tenor), Romeu e Julieta Fantasia-Ouverture, dificilmente se vê o vínculo. Muitos me perguntaram se seria necessário ler essas magníficas obras de Shakespeare para entender a coreografia. Ler Shakespeare é a beleza em si; não faria mal a ninguém. A Ouverture não precisa de uma ligação de conteúdo com as obras que se seguem (Brockhaus da música), como quis Ratmansky.
A 1ª. Ouverture teria sido identificada em 1640, abrindo um balé cênico em Paris, perto do instrumental de J.B. Lully. A Elegia é um gênero poético aparecendo nos anos 7 a.C. tendo sentido de tristeza ou melancolia. Fontes musicais recentes afirmam que essa conotação vai-se esvaecendo a partir do Renascimento. Fantasie – forma de realização instrumental livre de “obrigações musicais”, perto da improvisação. O título das peças musicais aparece desde o início do século XVI, algumas vezes ligado a danças e canções para dançar. A Fantasie pertence mais ao domínio da música e a Ouverture continua a ser mais empregada em óperas, ainda séculos mais tarde, com o nome de Prelúdio (para R. Wagner) ou Introdução (para G. Verdi).
Vamos nos lembrar de Ratmansky em nossa primeira entrevista, 2008, na cantina da Ópera de Paris, quando da tournée do Balé do Bolshoi, durante os intervalos de Spartacus, no papel-título Carlos Acosta. Já então nos confiou Ratmansky, diretor do Balé do Bolshoi à época, que o Bolshoi merecia um diretor 24 horas por dia. “Sou um artista livre que gostaria de dar o melhor de mim mesmo às companhias e aos bailarinos com quem trabalho”.
Alexei é russo-ucraniano, de pai ucraniano, nasceu em St. Petersburgo, depois estudos na Academia de Balé em Moscou. Dançou como primeiro solista no Balé Nacional da Ucrânia, no Royal Winnipeg Ballet e no Balé Real da Dinamarca. Desde seu tempo como bailarino, começa a coreografar para grandes companhias, como o Balé do Teatro Mariinski, o Balé da Ópera de Paris, o Balé Real da Dinamarca e o Royal Ballet. Ainda o American Ballet Theater e o New York City Ballet. De 2004 a 2008 fo ei diretor do Balé do Teatro Bolshoi e, a partir de 2009, coreógrafo residente do A.B.T. Decide, no entanto, não prolongar seu contrato com a Companhia e, em agosto 2022, começa como coreógrafo residente do New York City Ballet.
Livre das amarras administrativas do Bolshoi, uma esplêndida carreira abre-se a Ratmansky. Aos 40 anos. Suas reconstruções originais de obras clássicas permitiram uma rápida ascensão. Paralelamente, a diversidade de seus interesses artísticos: pintura e literatura. Daí o balé sobre Vassily Kandinsky, A Tempestade de William Shakespeare, Ana Karenina de Leon Tolstoi, As Perdidas Ilusões de Honoré de Balzac.
Para o Staatsballett de Munique, remontou Paquita, em 2014. Só falamos do que expressou quanto à herança da tradição, segundo as notações originais, que pôde obter e trabalhar sobre elas. “Quero aprender com Paquita, não como o balé é dançado hoje por outras companhias, em estilos diferentes, mas antes. Não entrar muito no âmbito da interpretação, mas na leitura dos documentos. Conectar-se com o passado é muito importante para mim, pois as coisas se perdem, os passos se perdem, o vocabulário da dança clássica se perde. Os passos desaparecem das salas de aula e, obviamente, do palco. Por isso, interesso-me pelas reconstruções sérias, tão exatas quanto possível”.
Foi difícil para a Companhia dançar “como antes”; os developpés mais baixos que 90 graus, os braços arredondados etc. Toda uma estética a aprender em algumas semanas. Um stress imenso para o Ensemble, Depois da geral, me confiou: “ Vou falar com eles, porque sinto em mim a responsabilidade, a possibilidade, não apenas de empregar todo esse material em minhas obras, mas transmitindo-o aos bailarinos”.
Não sei o que disse a eles, mas na première a Companhia mostrou-se como um Ensemble de grande nível, mesmo se nem todos dançaram “como antes”. Menos rigoroso com o Balé de Zurique foi sua reconstrução do Lago, com uma companhia mais acessível também a essa estética antiga. Mas sempre exigente. Apesar de ter ao lado da Companhia o Júnior Ballet, a Academia Zurique, os estudantes da Escola de Balé da Ópera de Zurique, ainda não estava completamente satisfeito; “Normalmente, são 24 pares, fora os outros participantes e os solistas”. Desarmante...
Com toda essa bagagem de vocabulário e linguagem dos passos e coreográfica, Ratmansky possui um fabuloso material para suas próprias coreografias. Faltou-me um componente, mesmo se não vi suas obras em toda profusão, e que senti no seu Lago, em Zurique: a proximidade emocional com Tchaikovsky. O que não reencontramos agora, na estranha escolha da Fantasia-Ouvertures de Tchaikovski, com um cenário dos mais sóbrios, a imensa cena às vezes praticamente “habitada” só por um solista.
A grande sobriedade já traz em si uma emoção, porque nela ficamos fixados naquilo que involuntariamente somos. Ou voluntariamente? A tradução musical dos passos, dos ângulos, das determinações do espaço, é sentida como um fino brilho de lembranças. Quem é Hamlet, quem são Romeu e Julieta, o que representa A Tempestade? Serão já arquétipos? Morte, Devastação, Amor-Paixão.
O fato de não querer, nesse momento, criar uma obra narrativa, mas peças de um grande compositor, sobre obras de um grande escritor, já é uma escolha. E qual? Dois imensos artistas, cujas obras já pertencem ao “inconsciente coletivo”, juntos, para uma grande obra emocional. A “narração”, que aparentemente não existe, é sub-reptícia, pois há também uma escolha das obras segundo um critério, seguramente um itinerário, psicológico e emocionalmente “narrativo”.
A ideia do coreógrafo de transmitir emoção ao público e uma relação das obras junto a ele é um pouco temerária, já que a emoção é fundamentalmente individual. Para William James, o essencial da emoção tem a ver com “mudanças corporais”.
Me reconhecendo como parte do público, não consegui o relacionamento desejado, sendo as obras distintas, certo, mas ligadas por uma dramaturgia interna, evidentemente mesmo musical. Entre os (certamente necessários) intervalos, longos, de 25 a 30 minutos, a emoção perde-se em “banalidades sociais”. A ideia do ótimo dramaturgo Serge Hoenegger de que Ratmansky conseguiria “deixar um mundo aparecer a cada momento, quando a cortina se abre, e ser capaz de estabelecer um novo começo”, não nos parecia difícil.
Mas...
Nos aproximamos do brilhante cenógrafo Jean-Marc Purissant, ex-bailarino do Balé da Ópera de Paris: “O balé clássico abstrato dirige nossa percepção, mas nos deixa a liberdade de pensarmos por nós mesmos, a liberdade de reflexão, dos sonhos e lembranças. Ao que responde no programa o próprio Ratmansky: “Na área da emoção estamos no balé particularmente credíveis. Porque podemos representar o indizível. De certa forma, a música também. Mas como bailarinos conseguimos ir mais além na representação da emoção, através de nosso corpo, rosto, olhos, nosso espírito, nossa energia. Mas o melhor de tudo é dançar”.
É do que falaremos em nosso próximo texto...
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Walter Haupt homenageia
Celi Barbier por seu Jubileu
Todos sabemos que Walter Haupt é um dos maiores compositores contemporâneos do mundo, afiliado a Carl Orff, seu mentor. Um dia, o mestre lhe “intimou”: você terá de encenar Carmina Burana, com fantásticos costumes da Idade Média, e bem engraçados, como quero. O que foi feito, na Köenigsplatz, em Munique, quando de seu centenário, 1895-1995. Estamos ainda longe da homenagem a Celi.
Criando os Sons das Nuvens e outras ideias inovadoras, como escrevemos no seu Portrait, quando no Brasil que adora, foram 250 mil espectadores em Copacabana para Carmina Burana. Uma loucura total, diz ele. Assim em São Paulo, no Pacaembu, assim no Teatro Municipal, no Rio de Janeiro. Na América do Sul, 18 espetáculos. Ao todo, 16 anos de tournées mundiais, 40 países, 200 espetáculos. Estrondoso sucesso!
Vale a pena rever nosso Portrait incluindo uma última obra, Marie Antoinette, para o Staatsballet de Linz, Áustria. Na época, com 85 anos e uma esplendorosa vitalidade. Para a obra, 76 músicos e 52 ercussionistas.
Em 1972, para os Jogos Olímpicos, coube ao ministro da Baviera fazer a encomenda. Uma obra expressamente coreográfica e inovadora, tendo Celi como co-coreógrafa e assistente do diretor de balé, dr. Dieter Gackstetter. Ela recém-chegada a Munique. Foi o primeiro balé do mundo usando raio laser.
“Pontualmente, trabalhamos juntos. Criei para Celi, um solo “A Noite”, que fez parte da minha criação “Träume”: Sonhos sobre Le Bateau Ivre de Rimbaud, cujos versos ela também recitava, tendo retrabalhado e destorcendo a voz, teve um impacto do irreal, a cena experimental, toda coberta de espelhos, mesmo o espaço para a dança, mil prismas.
Em 1979, Kontrapunkt, para a cena experimental, de grande sucesso. Segue uma noite inteira dedicada a Samuel Beckett, em homenagem aos 80 anos do grande escritor, Prêmio Nobel de Literatura, para o Ballet da Opera de St. Gallen (Suissa).
Depois da tournée de 16 anos, Walter quis conhecer seu país. Compraram, então, um Wohn Mobil e percorreram a Alemanha “desconhecida”. Um tour de force para a maravilhosa esposa Rosi, organizadora, administradora, esplêndida na gastronomia para os convidados e no savoir faire. Me receberam os dois na mansão perto de Munique, branca, com ornamentos dourados. Do verdejante jardim sobressaem estátuas femininas, lembrado as da Grécia antiga. Entrada real. Aos lados do portal, duas belíssimas estátuas de Buda, em bronze. Diante delas, um triângulo em vidro com velinhas acesas em seu interior. Que acesas ficaram quando Celi cruzou o portal, tendo sobre ela uma lira em ouro. Emoção...
Florinhas rosas e delicadas pensavam esconder o presente. Inesperado o Allegretto, especialmente composto – “para Celi”. A convite, dirigiu-se ela ao salão imenso, com piso de mármore, um piano de cauda à espera. Walter, sorriso aberto, com o humor que lhe é peculiar, sentou-se ao piano: “Será que posso ainda interpretar?” Os sons do Allegretto afloram em Celi, além de alegria, a reflexão e as lembranças.
“Celi, uma verdadeira beleza, uma graciosa figura de arte viva na qual o sensual encontra o espiritual e se funde em uma unidade estética.
Celi, minha alma gêmea!
Nós experimentamos tantas estreias de sucesso juntos. Você como a graciosa dançarina em minhas primeiras composições, mais tarde como a colaboradora extremamente inteligente em meus últimos trabalhos.
Trabalhar com você foi e é sempre um enriquecimento maravilhoso."